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“Os livros devem circular”, avalia Santareno
09/07/2015

“Um livro ganha vida nas mãos das pessoas”. A proposta do Pegaí – Leitura Grátis foi evidenciada durante a palestra do escritor e professor angolano, Santareno Augusto Miranda, na noite de quarta-feira na Associação Comercial e Industrial de Ponta Grossa (ACIPG). O evento que atraiu mais de 100 espectadores ao local, marcou os dois anos da proposta de leitura grátis em Ponta Grossa e a criação do Instituto Pegaí. Assim como o idealizador do Pegaí, Idomar Cerutti, o palestrante acredita que os livros devem circular. “Um livro na prateleira tem conteúdo morto”, avalia.
Aos onze anos, o escritor escutou de uma professora – Madalena – uma frase que o acompanharia por toda a sua vida. Ao presenteá-lo com seu primeiro livro, Madalena disse: “Os livros tem outro mundo a oferecer a você”. E foi em torno desta frase, que o menino – hoje escritor – seguiu seus passos. De uma aldeia em Angola, Santareno tornou-se um estudioso e autor de dois livros. Mas o caminho percorrido não foi nada fácil. A primeira barreira para embarcar neste novo mundo, foi encontrada em casa mesmo, ou melhor, em sua cabana. “Meu pai não queria que eu estudasse, pois outros irmãos já estavam frequentando a escola criada pela professora”. Mas a curiosidade, e a vontade de aprender do menino, foram maiores do que aquela primeira dificuldade. Sem nenhuma estrutura para proporcionar estudos, a aldeia recebeu a ‘professora branca’ Madalena que, junto com integrantes da aldeia, construiu uma cabana para ser a primeira escola do local. Ao se destacar como aluno, Santareno foi enviado para estudar na cidade. Neste momento inicia-se uma guerra, a ‘Guerra esquecida de Angola’, e Santareno acaba recrutado pelo exército. Seus estudos nesta época, foram interrompidos. E após algum tempo naquela situação, Santareno chega a dizer para si mesmo: “…minha vida perdeu o sentido”. Após contar alguns dos tantos momentos vividos por ele durante a guerra, relata que acaba por deixou o exército. “Um caminhão no qual eu me encontrava acionou uma mina e eu acabei por adquirir uma deficiência física”. Volta para a cidade e então surge uma “luz no fim do túnel”. Quando vai viver com ex-combatentes em um quartel e, fruto do aprendizado que já havia conquistado, passa a ensinar os demais a ler e escrever. Ou seja, aquele episódio que poderia ter lhe tirado a vida, acabou por dar uma nova oportunidade de vida a Santareno. Ele improvisou um “quadro-negro” no quartel onde estava morando para ensinar. Após iniciá-los ao mundo das letras, surgiu um problema: eles não tinham livros para ler.
Perdido em sua nova jornada, mas já com um novo sentido para sua vida, Santareno achou na lata de lixo o seu caminho. “Foi aonde encontrei uma revista com o anúncio de uma escola em Maringá. Para mim abriu-se uma porta”, destaca. Estava decidido, ele viria estudar no Brasil. Com a ajuda de soldados brasileiros integrante das Nações Unidas, conseguiu comprar sua passagem. Em Maringá, um novo desafio, não tinha onde morar. Ele foi ‘salvo’ por colegas japoneses que moravam em uma república, mas devido ao preconceito de um destes colegas teve uma nova mudança. Desta vez foi acolhido por uma família de Curitiba. “Eles me davam dinheiro pra eu comprar roupas e comida. Mas eu preferia comprar livros”, justifica, lembrando que a ‘economia’ fez com que ele começasse a enviar livros para sua antiga aldeia.
Aí os livros começaram a transformar as vidas de outros angolanos. “O livro muda a vida das pessoas”, garante, recordando que muitos dos moradores da aldeia começaram a estudar e a mudar de vida após as leituras dos livros enviados por Santareno. Hoje, seu trabalho, além de lecionar, é arrecadar e enviar livros para Angola. “Eu estou aprendendo com o Pegaí. Quem sabe, daqui a algum tempo, não é o idealizador deste projeto que estará em Angola falando de sua experiência”, disse.
Com esta lição de vida, Santareno finalizou sua palestra e o encontro com voluntários e leitores do Pegaí. A paixão pelos livros encerrou o momento. “O livro traz novos valores e uma visão mais ampla do mundo. Eles nos motivam, nos inspiram”, destaca, completando que está na hora de darmos sentido à vida de outras pessoas. Para isto os livros precisam circular.

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